O forte aumento no preço dos produtos nos supermercados, do gás, do aluguel, da gasolina e da conta de luz tem obrigado as pessoas a inventarem estratégias financeiras para sobreviverem aos altos preços.
Os mercados passaram a vender alimentos que antes eram descartados ou enviados para fabricação de rações e outros produtos. É o caso do feijão bandinha (feijão partido) e do fragmento de arroz. Isso porque o preço do feijão inteiro e do arroz se tornou financeiramente inacessível para muitas famílias.
Esses aumentos somados a crise financeira-sanitária, como consequência principal da pandemia, aumentaram as desigualdades sociais. A quantidade de pessoas passando fome e em situação de insegurança alimentar aumentou, conforme o Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil.
Fome e insegurança alimentar são como parentes próximas. As pessoas em insegurança alimentar são aquelas que se alimentam, mas não da forma como deveriam. Não comem todos os componentes necessários para uma refeição completa e saudável. Já as pessoas que passam fome, se enquadram em um próximo estágio, o de vulnerabilidade social.
E o que isso tem a ver com meio ambiente? Recentemente, falei de sustentabilidade e resiliência das cidades, (veja aqui). Os assuntos se relacionam, já que tais circunstâncias impedem a sustentabilidade nas cidades.
O aumento de desigualdades sociais e de vulnerabilidades quebram o pacto de um dos tripés da sustentabilidade, o ‘socialmente justo’. Não à toa que, ‘acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares’ é o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável número 1 da agenda 2030 da ONU.
É preciso demonstrar também que, a situação atual não tem origem somente na pandemia. Com o dólar em alta, compensa mais para os grandes produtores exportarem seus produtos. Isso faz com que esses produtos faltem nas prateleiras nacionais e se tornem mais caros.
O mesmo acontece com a carne, que junto dos grãos tem sido exportados, enquanto faltam por aqui. No entanto, essa situação poderia ter sido evitada se a Companhia Nacional de Abastecimento, principal órgão de apoio à agricultura familiar, não tivesse fechado 27 de suas unidades armazenadoras de alimentos.
Ou ainda, se os agricultores familiares não tivessem tido seus benefícios emergenciais negados ou se sucessivos cortes orçamentários não tivessem ocorrido na Embrapa e o Conselho de Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional não tivesse sido extinto.
É papel do governo proteger o mercado interno e criar incentivos, apoio financeiro e outras medidas necessárias para viabilizar a comercialização, estoque e plantio de alimentos suficientes destinados aos brasileiros. É assim que age um Estado que se diz nacionalista.
Ao invés disso, vemos uma situação que poderia e deveria ter regulamentação estatal tomar proporções que representam retrocesso social em mais de 15 anos. Movimentos em detrimento de lucro econômico que não colabora com o desenvolvimento justo do país e permanece concentrado nas mãos de poucos.

Natália Teixeira Dias é advogada, graduada pelas Faculdades Integradas de Guarulhos, especialista em Direito e gestão do Meio Ambiente pelo SENAC